sexta-feira, 2 de janeiro de 2015

E viveram reinventados para sempre!

        Era uma vez a Bela Adormecida que foi beijada pelo seu príncipe e, depois que acordou - com um bafo de anos -, eles se beijaram e viveram felizes para sempre. Era uma vez a Rapunzel que possuía longos, lindos e "bem cuidados" cabelos - definitivamente cheio de piolhos; foi beijada pelo seu príncipe e eles viveram felizes para sempre. Era uma vez a Cinderela que 1º) perdeu o sapatinho de cristal 2º) o príncipe saiu à procura da dona do sapatinho 3º) ela era a única em toda a região que tinha o pé do tamanho do sapato - quanta sorte!. E, claro, eles viveram felizes para sempre.
        Muito me impressiona o fantástico e o inalcançável presente nos "contos de fadas". Elementos que passam a ideia de um final perfeito, sem circunstâncias, acidentes, arrependimentos ou frustrações. Enganamos bem nossas crianças. Cria-se, então, o imaginário do final feliz, o qual nos prende à expectativa do momento em que seremos realmente felizes. Esquecemos, pois, de um importante e implícito elemento: o processo.
        "Finais felizes" são tediosos, maçantes, monótonos e insatisfatórios. A felicidade legítima se encontra no processo de ser feliz. Um processo, com toda certeza, marcado por sofrimentos, caos, aborrecimentos, amores imperfeitos e perdas. A questão é que não fomos preparados pra momentos como esses, e fica evidente que as histórias infantis também não exercem essa função. No entanto, seria melhor se fôssemos treinados para o imponderável? Uma visita surpresa de alguém que você estima muito, um beijo roubado, a notícia de que será pai, presenciar primeiros passos de um pequenino, ver a felicidade nos olhos de um senhor ao entrar pela primeira vez no mar. Se fôssemos adestrados a lidar com os momentos de caos, também seríamos adestrados a lidar com os momentos de prazer. E, por favor, qual seria a graça de viver assim?
        Por isso, quando eu for mãe, contarei histórias aos meus filhos, como qualquer boa mãe. Elas começarão com o "era uma vez" e não terminarão, todo dia haverá uma continuidade, a qual será criada por eles próprios. E o imponderável? Serei eu. Em meio ao processo criativo, elaborarei circunstâncias para que as crianças se induzam a recriar seu processo. Se tal dinâmica dará certo? Não sei... Só sei que não será nem um pouco tedioso, maçante, monótono e insatisfatório.
        O melhor "final feliz" é aquele que pode ser constantemente reinventado. 


                                                                                                                                 Julia Lima