sábado, 28 de junho de 2014

A proximidade entre o padecer e o prosperar

        Recentemente aprendi uma coisa: permita-se sofrer.
        A percepção de sofrimento que se constrói é a mais refutada possível, e com razão. Construímos um mundo rodeado de fatos e feitos que nos alegrem, nos engrandeçam e que nos possibilite a fuga de nossas inseguranças, por mais banais que estas sejam. No entanto, devemos nos obrigar a passar pelo sofrimento. Caso contrário, criaremos um imaginário idealizado, o qual nos proporcionará uma visão fantástica e virtual daquilo que estamos vivenciando.
        Assim como no Romantismo (1ª Geração), apesar de seu contexto de delimitação da classe burguesa e da classe operária, este ficou marcado pela produção poética nacionalista e idealista, além de ser voltada para a classe dominante, apresentava, agora, um herói nacional resgatado do remoto:  o índio. Talvez o caro leitor chegue à conclusão de que esta foi uma ótima escolha e, evidentemente, teria sido, se tal herói fosse constituído no período ascendente à "descoberta" do Brasil (pois, segundo a didática, os índios são entrelaçados a tal período, como se sua identidade dependesse da suposta "descoberta" dos portugueses, mas não, essa ultrapassava e ultrapassa a visão etnocêntrica). Contudo, ao partir do fundamento contextual romântico, é inegável a discordância e insatisfação literária com relação ao herói da nação, pois, em meio à distinção de classes socias e a prevalência de apenas uma, a qual possuía uma literatura voltada apenas para a mesma e seu propósito ideológico, como ainda ansiar pelo índio para representar sinteticamente a realidade brasileira? Dessa forma, cutuquemos a ferida: a busca do herói ideal mascarou a efetiva realidade nacional contundida de desigualdades, incoerências e lutas. Do mesmo modo, tal opção proposital de fuga, simboliza o já citado anteriormente: a necessidade de se evitar o sofrimento a qualquer custo, seja por razões justas ou impostas.
        À vista disso, devo ressaltar que evitar a aflição não resulta a nada, somente enfatiza a universal capacidade do ser humano de ser incapaz de superar suas vozes interiores. Nesse sentido, viver o sofrimento é doloroso e angustiante, mas é a única maneira de sararmos as feridas que nos são agregadas no decorrer da nossa jornada. Para mais, a aflição nos acarreta um oceano de contrariedades internas que nos levam a compreender e conceituar, à nossa maneira, o que é "penar", e, somente assim, saberemos conceituar também aquilo que é bom, agradável e favorável. Ou seja, para que reconheçamos o prazer, é preciso que antes passemos pelo sofrimento e todo o seu lento processo. Por isso, caro leitor, não tenha medo de sofrer, pois, posteriormente, se tornará significativamente grato ao que se passou.
 
                                                                                                                                Julia Lima

domingo, 8 de junho de 2014

A despercebida falha da Utopia

       Aquilo que é utópico me desagrada. O constantemente inalcançável me desmotiva. Afinal, por que desejar o idílico, e depositar sua energia na conquista desse, se há um mundo a sua volta repleto de imperfeições apenas esperando algum destemido que lute em prol das mesmas? A resposta se encontra no escapismo. Nós, como fracos humanos, não suportamos todas as imperfeições que presenciamos e vivemos (e na maioria das vezes, as nossas próprias), devido a isso, transferimos a realidade para um mundo criado por nós, fantasioso e irreal, o qual, tendo em vista nossa incapacidade, se demonstra como um todo perfeito.
        No entanto, o perfeito precisa ser necessariamente ideal ou utópico? A perfeição não pode estar simplesmente em sua antítese, a imperfeição? A maioria das pessoas considera a palavra "perfeito" como algo incontestável - "o que é perfeito basta" - mas não concluem que o "perfeito" é apenas uma tese e o "imperfeito" sua antítese. Quem sabe Friedrich Hegel concordasse com o meu exemplo. Da tese e da antítese, resultam a síntese, contudo, o que surgiria da perfeição contradita pela imperfeição? A síntese de tal mistura, meu caro leitor, é você quem define.
        Portanto, "seria a perfeição uma utopia?" Não. "Seria a minha definição de perfeição uma utopia?" Talvez. Mas, logo adianto meu ponto de vista: Não há nada de mais perfeito do que imperfeições se unindo em busca de algo maior. O perfeito considerado idílico e utópico é chato, tedioso, imóvel e, por mais que não aparente, extremamente falho.

                                                                                                                                Julia Lima

domingo, 1 de junho de 2014

A suficiente insuficiência do ser poético

    De inspiração o poeta é feito e da inspiração se torna refém.
    Afinal, no que se consiste a mesma?

    É como a porosidade da pele
    que, uma vez abusada pela inflamação,
    Expele aquilo que, verdadeiramente, há por dentro?    
    Ou é como os livros que
    Quando abertos, revelam um mundo fantástico e idílico,
    O qual se finda com o término da leitura?
    Ou será como a discussão de Heráclito e Parmênides acerca do devir,
    A qual se eternizou por gerações?

    De todas as incertezas, uma eu afirmo:
    A potencialização do poeta provém do questionamento,
    Da antítese
    Do "perder-se" em si
    Da epifania
    Da contradição
    Da ambiguidade    
    A inspiração poética vem do "ser", ou melhor,
    da insuficiência do ser.

    O ser em sua completude, não gera movimento.
    Antes o insuficiente que tende a ser preenchido,
    do que a completude que tende a se esvair.

                                                                                              Julia Lima